Era
uma vez cinco filhos que não mereciam ser chamados assim.
Era
uma vez cinco monstros.
Começar
com Era uma vez, não é
coerente, visto que essa história não é uma ficção.
Há
ótimas e lindas histórias para contar no Dia das Mães. Poderia fazer uma
homenagem a minha, falar de mulheres fortes, de famílias unidas, mas nesse
momento penso numa mãe que não é a minha, e foi uma sofredora. Penso nos filhos
dessa mulher, e sinto raiva. Uma vontade imensa de desabafar. Mas, como fui
mera voyeur só me resta relatar e despertar
reflexões, ou não.
Ela
fumava compulsivamente, não comia, não chorava, não dormia, apenas sofria e
emagrecia. Eles a observavam, e só davam trabalho. Nenhuma alegria. Mentira,
alguns deram netos, ou seja, um pouco de felicidade. Deram roupas para lavar,
costurar e passar. Deram desgosto. Não davam amor. E mentiam para todos: “Ela
está ótima, e está fumando menos”.
Ela
era simples, ignorante, analfabeta, pobre, muito carente e amava imensamente
seus filhos. Sofreu muito durante seu casamento; passou fome, mas os educou da
melhor maneira que pôde; insistiu que estudassem e tivessem uma vida melhor.
Ela
sofria com a vida, um peso que não suportava. O marido faleceu, e
“perdeu” um filho para as drogas.
Mas
ainda restam quatro filhos. Certo?
Não.
Restam
quatro mentirosos, falsos, hipócritas, quatro voyeurs. Quatro pessoas diante de
um sofrimento visível. Diante da dor que não era dos outros, era da própria
mãe. Quatro pessoas que causavam muita dor: Dor do abandono, Dor da
indiferença, Dor do desamor...Quatro pessoas que estavam tão perto, tão longe.
Queria
falar dos quatro aqui, mas confesso que sinto náuseas. Falarei de um. O pior de
todos.
O
mais novo, que não é tão novo assim.
Fulaninho
é um ser desprezível. Em todas as oportunidades que teve, escondeu sua
mãe. Tinha vergonha. Tinha raiva de ser pobre e a culpava.
Fulaninho
virou evangélico, querido entre os amigos da igreja.
Fulaninho
aceitou Jesus e foi batizado. E ela, mesmo sabendo que seu filho a desprezava,
desejou muito ver o batismo, porém foi proibida, ele não queria que seus irmãos da igreja a vissem. Ela imaginou
que o tal do batismo o ajudaria a ser melhor. Estava enganada. Completamente
enganada.
Fulaninho
cantava alto músicas evangélicas, e em seguida mandava a mãe se foder.
Fulaninho orava alto e em seguida mandava a mãe e seus irmãos tomarem no cu.
Fulaninho
conseguiu um emprego, graças a um senhor da igreja, mas não queria ajudar em
casa, mesmo sabendo que a mãe fazia uma refeição por dia. Fulaninho comprava
roupas novas, comprou até um terno, enquanto sua mãe tinha alguns vestidos
rasgados.
Ela
não abria a boca, e não pedia ajuda. Nunca admitiu que precisava de ajuda.
Nunca admitiu a indiferença do filho. Defendia. Dizia: “Ele é assim mesmo,
puxou ao pai”. Dizia: “O cigarro tira minha fome”.
Ela
estava fraca. A insensibilidade dos filhos a matava, principalmente a do
Fulaninho, o caçulinha.
Eles
(os quatro) sempre davam dinheiro para o cigarro, e consideravam isso um
carinho. Eram muitos cigarros por dia, e uma tosse horrível. Ela raramente ia
ao médico, mas sentia dores fortes no peito, e eles compravam mais cigarros.
Ela
foi para o hospital.
Eles
não se preocuparam.
Ela
ficou em coma.
Recebeu
algumas visitas.
Ela
morreu.
...
Já
que Fulaninho não tem mais mãe, passou a tarefa das roupas para irmã.
E
disse: "A vida continua".